Pedras
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Pedras
Pega duas pedras nas tuas mãos. Uma significa tu próprio; outra significa alguém com quem tens dificuldade em te relacionar. Junta as duas pedras. Acolhe as duas pedras. Duas pedras de pedra não se relacionam. Duas pedras gente comunicam-se e unem-se na fraternidade, no ideal, na missão. Recorda o que te magoa. Quem é o outro para te magoar? O que tem, o que faz, o que diz (disse). Recorda quem és tu para magoar o outro. Que pedra és tu? Compreende a tua pedra e a pedra que o outro é, e caminha para o perdão, para a união, para a construção. Que pedra eu sou?
Se as pedras falassem... quantos segredos nos contariam.
A pedra rejeitada.
A pedra do túmulo.
A pedra do altar do sacrifício, de expiação e de ação de graças.
A pedra do rochedo, no meio daquele deserto.
Aquela pedra de condenação...
E a rejeitada tornou-se pedra angular, a que abre o espaço da comunidade,
a que fortalece a construção (cf. Mt 21,42; At 4,11; 1Pe 2,4.7; Lc 20,17; Mc 12,10; Sl 118,22).
E a do túmulo rolou pela explosão do amor (cf. Mc 16,3-4; Mt 27,60; Jo 11,38; Lc 24,2).
E a do altar tornou-se Jesus, «sacerdote, altar e cordeiro» (cf. 1Sm 6,14-15;1Rs 18,32; Dt 27,5-8).
E a do rochedo, um manancial no deserto (cf. Is 48,21; Sb 11,4; Sl 78,16; Dt 8,15).
E a de condenação tornou-se a pedra da verdade, da misericórdia, do perdão (cf. Jo 8,7).
O coração de pedra, o que nos contaria?
As pedras de condenação (cf. At 7,59; Jo 10,31; Jo 8,5.59).
As pedras de tropeço (cf. 1Pe 2,8; Mt 16,23; Sl 91,12; Sir 32,20).
As pedras da idolatria (cf. Ez 20,32; Jr 3,9; Jr 2,27; Dt 28,36).
As pedras de escândalo, «quem escandalizar um destes pequeninos…» (Mt 18,6; Lc 17,2; Mc 9,42).
As pedras onde secam as raízes (cf. Lc 8,13).
As pedras da construção provisória (cf. Lc 21,6; Mc 13,2; Mt 24,2).
As pedras da tentação (cf. Lc 4,11; Mt 4,3).
São muitas pedras, pedras de muitas formas, de muitas funções.
E mesmo que o coração seja de pedra, Deus pode transformá-lo
em coração de carne (cf. Ez 2,4; 3,7; 11,19; 36,26; Jr 5,3; Is 46,12).
E mesmo que seja pedra do caminho, Deus pode fazer dela um filho de Abraão (cf. Lc 3,8).
Pedras que gritarão (cf. Lc 19,40).
Pedras de aliança (cf. Js 24,26-27; Dt 9,9-11; Dt 4,13;
Ex 31,18: «Eram tábuas de pedra, escritas pelo dedo de Deus»; Gn 35,14; Gn 31,44-48).
Pedras fortes (cf. Jb 6,12).
Pedras do jovem David (cf. 1Sm 17,49-50; Sir 47,4).
Muitas pedras para serem vivas: de construção (cf. 1Rs 5,31;
1Pe 2,5); de alicerce (cf. 1Cor 3,12); pedras preciosas aos olhos
de Deus; pedras escolhidas (cf. Is 28,16).
E sobre esta pedra
«Jesus chegou à região de Cesareia de Filipe, e perguntou aos seus discípulos: “Quem dizem os homens que é o Filho do Homem?” Eles responderam: “Alguns dizem que é João Batista; outros, que é Elias; outros ainda, que é Jeremias, ou algum dos profetas.” Então Jesus perguntou-lhes: “E vós, quem dizeis que Eu sou?” Simão Pedro respondeu: “Tu és o Messias, o Filho do Deus vivo.” Jesus disse: “És feliz, Simão, filho de Jonas, porque não foi um ser humano que te revelou isso, mas o meu Pai que está no Céu. Por isso Eu digo-te: tu és Pedro, e sobre esta Pedra construirei a minha Igreja, e o poder da morte nunca poderá vencê-la”»
(Mt 16,13-18).
«Jesus perguntou a Simão Pedro: “Simão, filho de João, amas-me mais do que estes outros?” Pedro respondeu: “Sim, Senhor, Tu sabes que eu te amo.” Jesus disse: “Cuida dos meus cordeiros.” Jesus perguntou de novo a Pedro: “Simão, filho de João, amas-me?” Pedro respondeu: “Sim, Senhor, Tu sabes que eu te amo.” Jesus disse: “Toma conta das minhas ovelhas.” Pela terceira vez Jesus perguntou a Pedro: “Simão, filho de João, amas-me?” Então Pedro ficou triste, porque Jesus perguntou três vezes se ele o amava. Disse a Jesus: “Senhor, Tu conheces tudo, e sabes que eu te amo.” Jesus disse: “Cuida das minhas ovelhas”»
(Jo 21,15-17).
Sobre ti que amas e que vives da fé no Cristo Filho de Deus,
Palavra de vida eterna, Deus constrói a nova humanidade.
Tu és pedra
As pedras são duras, caladas e monótonas. Frias. Incomodam.
As pedras de um monumento são talhadas, trabalhadas, esculpidas.
As preciosas são polidas. Pedras de maior e menor resistência. Simples.
As pedras vivas também incomodam. Uma pedra será sempre uma pedra.
«No meio do caminho tinha uma pedra» (Carlos Drummond).
Percebe o teu lugar e a tua importância, a tua forma de ser pedra,
dentro da comunidade, na construção da comunidade.
Pedra de aliança; pedra angular, pedra da parede da construção, pedra do chão;
pedra do muro que guarda a habitação;
pedra preciosa, estimada, querida; pedra do altar, da entrega, do compromisso;
pedra separada, isolada, triste, perdida;
pedra rancorosa, amarga, empedernida;
pedra alegria e esperança, quente, viva;
pedra de túmulo, pedra de ressurreição;
pedra polida, talhada; pedra bruta, intocada.
Podemos dizer: todas as pedras são pedras, mas umas são mais
pedras do que as outras.
Templo de Deus
«Nós trabalhamos juntos na obra de Deus, mas o campo e a construção de Deus sois vós. Eu, como bom arquiteto, lancei os alicerces conforme o dom que Deus me concedeu; outro constrói por cima do alicerce. Mas cada um veja como constrói! Ninguém pode colocar um alicerce diferente daquele que já foi posto: Jesus Cristo. Vós não sabeis que sois templo de Deus e que o Espírito de Deus habita em vós? Se alguém destrói o templo de Deus, Deus o destruirá. Pois o templo de Deus é santo, e esse templo sois vós» (1Cor 3,9-11.16-17).
«Aproximai-vos do Senhor, a pedra viva rejeitada pelos homens, mas escolhida e preciosa aos olhos de Deus. Do mesmo modo, vós também, como pedras vivas, ides entrando na construção do templo espiritual, e formando um sacerdócio santo, destinado a oferecer sacrifícios espirituais que Deus aceita por meio de Jesus Cristo» (1Pe 2,4-5).
«A pedra que os pedreiros rejeitaram tornou-se a pedra angular»
A pedra angular abre o espaço da comunidade, junta as paredes, fortalece a construção. É uma pedra talhada e escolhida, querida.
A pedra rejeitada é uma pedra que traz feridas. Sente-se não querida, não escolhida, não amada. Às vezes inferiorizada, ciumenta, sensível às palavras e atitudes dos outros, desconfiada.
Faz a experiência de seres pedra rejeitada: descobre momentos em que te sentiste rejeitado/a. Como percebes a rejeição na tua vida? Hoje, inferioridade, desconfiança, ciúmes, competição, sensibilidade, criatividade, imaginação, passividade, agressividade... podem ser frutos da rejeição sentida.
Faz a experiência de seres pedra escolhida: mesmo sentindo rejeição(ões), tornaste-te pedra de uma construção, de uma comunidade. Tens amigos e amigas, companheiros de ideal, irmãos e irmãs na mesma missão, peregrinos no mesmo desafio de ser. Descobre também os teus tempos de pedra angular, as tuas oportunidades de te tornares pedra angular. Tu és pedra de construção. Mesmo que não sejas angular, és pedra viva de uma comunidade. Descobre o teu valor e o teu lugar.
Tantas pedras rejeitadas tornaram-se, mais tarde, importantes na construção. São pedras vivas que curaram feridas da rejeição, restauraram a confiança, e assumiram viver, ser em comunhão.
Jesus Cristo, pedra rejeitada
Jesus conviveu conscientemente com a rejeição. Como profeta, Ele sabia que «nenhum profeta é bem recebido na sua terra» (Mt 13,57), e que «assim fizeram com os antigos profetas» (Mt 5,12) que foram rejeitados. Várias vezes, os judeus pegaram em pedras para o apedrejarem (cf. Jo 10,31), e ficaram irritados com Ele e planearam matá-lo (cf. Mc 3,6; Jo 5,16). Jesus viveu a rejeição, fortalecido pelo projeto de Deus Pai, pelo seu amor, pela sua comunhão com Deus Pai. Por isso, Ele permaneceu inteiro. A rejeição que sofreu não o desviou do caminho do Pai. Antes, fê-lo doar livremente a sua vida como amor e no amor. «Ninguém me tira a vida, Eu dou-a livremente» (Jo 10,18). Se a rejeição afeta o nosso ser, a nossa vida e a nossa entrega no amor... com Jesus isso não aconteceu. Jesus permaneceu livre doando a sua vida como amor, como Reino de Deus vivo e pleno na História.
Jesus conviveu com a rejeição, passando livre no meio das pessoas que o rejeitaram (cf. Lc 4,29-30); perseverando no anúncio do Reino (cf. Jo 7,25-26); evitando os que queriam matá-lo, pois não tinha chegado a sua hora (cf. Jo 7,1.30); sofrendo as consequências da rejeição: «Jesus começou a ensinar os discípulos, dizendo: “O Filho do Homem deve sofrer muito, ser rejeitado pelos anciãos, pelos chefes dos sacerdotes e doutores da Lei, deve ser morto, e ressuscitar depois de três dias”» (Mc 8,31); ao longo da sua vida, Jesus permanece amor, perdão, misericórdia, redentor. Jesus não desanima do projeto do Reino, acredita nos discípulos mesmo nas negações (cf. Mt 26,69-75), não se refugia na vitimização sem sentido.
As palavras de Jesus na sua morte, momento mais forte da rejeição humana, mostram que Ele permanece livre e entregue ao amor do Pai: «Pai, perdoa-lhes, pois não sabem o que fazem» (Lc 23,34); «hoje mesmo estarás comigo no Paraíso» (Lc 23,43); «tudo está consumado» (Jo 19,30); «Pai, nas tuas mãos, entrego o meu espírito» (Lc 23,46); «tenho sede» (Jo 19,28); «mulher, eis aí o teu filho; filho, eis aí a tua mãe» (Jo 19,26-27); «meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?» (Mc 15,34).
A rejeição não corrompeu a personalidade de Jesus. Ele é feito de amor encarnado e libertador, e permaneceu assim a vida inteira. Não viveu como alguém inferior, não amado, carente; encarou a vida com confiança plena e, diante da agressão, não desviou a cara (cf. Is 50,4-9). A sua identidade no amor do Pai era mais forte que todas as rejeições humanas. O amor rejeitado não deixou de ser amor e de amar.
Ressuscitar com Cristo é tornar-se pedra viva
de um edifício vivo
De grupos, de comunidades, pedras vivas da Igreja
Pedras vivas de fé, vivas de amor, vivas de alegria
Pedras jovens de um edifício novo
Pedras de contradição, de anúncio
Pedras de ação, de compromisso.
Pedras de transformação, pedras da profecia, pedras livres, pedras da libertação.
Tu és pedra, e sobre esta pedra...
Pedra da paz, da verdade, da justiça, pedra da comunhão, da misericórdia
Pedra da evangelização...
E nasceram muitos grupos, muitas comunidades
Porque tu és pedra, pedra viva do Reino.
O Senhor move-se em ti.
Pe. José Luís, CSh