O Milagre do Pão

Compartilhamento

O Milagre do Pão

 

Perguntei a um agricultor pelo milagre do pão. E ele levou-me a contemplar um campo lavrado. Chão aberto em leivas estiradas e belas. Alinhadas e livres. Prontas para acolher uma mão de sementes.

Depois levou-me a um celeiro onde guardava sementes de trigo. Dormentes numa arca à espera da liberdade. E disse-me que as sementes não foram feitas para serem guardadas e escondidas. Mas para serem lançadas à terra. 

Na manhã seguinte levou-me com ele ao campo lavrado. E levou consigo as sementes de trigo. E espalhou-as ao vento. E deu-me um punhado de grãos para que os soltasse nesse chão lavrado. E descobri que as sementes e a terra estavam prontas para o milagre do pão.

Algum tempo depois passei junto desse campo e o vento ondulava o trigo já crescido com um verde-esperança de encher os olhos. A promessa de fruto abundante oferecia-se nesse trigal-mar de verde. 

O calor do Verão já anunciava outros coloridos e o campo de trigo transformou-se numa seara cor de ouro. Pronta para a foice. Com molhos de trigo e milhares de grãos debulhados. Prontos igualmente para serem imolados.

E o trigo deixou-se moer. Imolar. Amassar. Transformar. E ser pão. Umas mãos rudes e simples… as mesmas que lançaram sementes em terra aberta, ofereceram grande ternura para recolher do trigo tamanha gratidão.

É assim o milagre do pão. É processo. Alegria. Esperança. Empenho. Acreditar. Sonhar. Esperar. É silêncio. Virtude. Aconchego. Proximidade. Gratidão. Mistério. Desde o campo lavrado à espera do grão até à mesa de todos os famintos.

Deus quis ser pão na mesa-altar e oferece-se com a mesma leveza do grão de trigo, com as mesmas mãos do agricultor, com o mesmo acolhimento da terra lavrada, com a mesma esperança do campo ondulado pelo vento, com a mesma promessa de uma seara cor de ouro feita de grãos prontos para a ceifa. 

Deus quis ser pão e nas mãos de um jovem de Nazaré ofereceu-se como pão de proximidade, como acolhimento, como esperança e plenitude, como vida verdadeira em campos-coração abertos, igual ao campo lavrado com as leivas estiradas e livres.

Deus quis ser pão e ofereceu-se como pão amassado no alto de uma cruz. Como imolação maior de uma vida oferecida e livre. Como promessa de liberdade e plenitude para quem já não acreditava mais em nenhum milagre. 

Deus quis ser pão para que nenhum faminto ficasse por saciar. Para que nenhuma fome obrigasse um homem a curvar-se sobre si mesmo e permanecer caído e trémulo. Deus quis ser pão para que a profecia da fraternidade se alimente dessa partilha do pão e se estenda a todos os lugares escondidos onde falta pão e sentido.
Deus quis ser pão para que a festa do Reino se recrie quotidianamente numa mesa de fraternidade, de homens e mulheres iguais… a caminho da liberdade e da alegria. Apesar das fraturas e das des-sintonias. Das inimizades e das indiferenças. Das injustiças e das desigualdades.

Deus quis ser pão-profecia. Milagre sempre novo. Atualizado no altar da eucaristia e no altar do mundo. No campo-terra lavrada à espera da semente e no campo-altar de cada vida-coração-história. Onde acontecem repetidos e silenciosos milagres… como o milagre do pão.

Deus quis ser pão. Para que a minha e a tua vida se transforme em milagre semelhante. Para que seja campo aberto, livre, acolhedor, silencioso e grato para com todos as sementes. As de liberdade e de compromisso. E as que ainda não puderam desabrochar, mas que já são uma promessa com destino igual a um campo de trigo pronto para se transformar em pão.

Deus quis ser pão para que possas atravessar a vida, livre e pobre, igual a um campo lavrado e largo, de leivas abertas a todas as sementes. E carregues dentro esse alimento de fraternidade. E sejas pão. E ofereças um coração iluminado-partilhado nas travessias do mundo.

Deus quis ser pão levado em procissão em dia de Corpus Christi, indo aos lugares onde habitamos, aos campos onde lançamos sementes, oferecendo-se em custódia erguida nesse chão do quotidiano onde se tece o nosso caminhar. 

Deus quis ser pão para que possamos também ser custódia viva – num tempo em que as custódias solenes ficam retidas em suas igrejas - erguida nos palcos mais desafiadores ou nos lugares silenciosos onde estamos. Andando. Vivendo. Amando. Silenciando. Arriscando. Imolando o coração e os dons para que o milagre do pão aconteça e permaneça nas leivas do mundo. Para que uma procissão de custódias vivas ofereça a ternura de Deus feita pão no altar da eucaristia.

Deus quis ser pão… Há uma humanidade sedenta-faminta à espera da mesma imolação para que o milagre do pão continue a alimentar a sede de fraternidade e tantas outras. Essas pelas quais um Filho se entregou e quis ser Pão. 
 

Pe. Afonso, CSh

Veja o ultimos artigos da Comunidade

Acompanhe nossas redes sociais

Siga-nos pelo Facebook

Siga-nos pelo Instagram

Acompanhe nosso canal no Youtube