Abaixar-se para ascender

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Abaixar-se para ascender

 

Um Deus-Filho desceu até ao nosso humano.
Fez-se um de nós. Palmilhou o mesmo chão
Descobrindo no encontro com a terra que somos
A riqueza, o infinito, o imenso dom
Do que significa ser gente, ser presente
Amor sem igual por um abaixamento feliz.


Um Deus-Filho abaixou-se e se fez tenda
Fincada num chão de barro, coração
Há muito ferido, sofrido e pobre
Mas buscador e desejando por um céu
Para se tornar inteiro e sonhador
Mesmo sem saber que caminhos percorrer.


Um Deus-Filho abaixou-se e se fez tenda
Lugar de encontro nos desencontros nossos
Desejando acolher em presépio aconchegante
Pastores e pobres, contadores de estrelas
Nas noites das redondezas de Belém
E todos os outros mesmo em noites sem luz.


Um Deus-Filho abaixou-se e se fez tenda
Chegada de todos os caminhos mesmo os sem nome
Encontro feliz para os que na região da sombra
Moraram desde sempre desejando um sol maior
Essa luz que vence trevas e dores
E oferece aos sedentos sementes de infinito.

Um Deus-Filho abaixou-se e se fez tenda
E encontrou redes à beira mar em terras da Galileia
Na companhia de pescadores pobres deixou convite
Para outras fainas em mares mais distantes
Aqueles que um futuro irá abrir e navegar
Juntando na mesma barca todos os filhos.
Um Deus-Filho abaixou-se e se fez tenda
Para trilhar connosco a insegurança dos caminhos
Palmilhar o pó nas idas e vindas de sítios longe
E subir escadas de casas onde ninguém vai
E ser tocado e abraçado por mãos de trabalho
Ou aquelas que só sabem oferecer perfumes caros.

Um Deus-Filho abaixou-se e se fez tenda
Cobrindo caminhos de solidão com ternura de abraços
Por onde andarão os que abraçando vão
Seguindo passos iguais e desbravando margens
Onde esperam outras multidões sedentas
E outros corações de galileias tão distantes.

Um Deus-Filho abaixou-se e se fez tenda
Abrigo de todos os pobres e malditos sem vez
De todos os que atirados ao chão
Pedem um olhar e a proximidade de chegar perto
Esse toque de vinho e azeite para cuidar as feridas
E outras mazelas de dentro que também provocam quedas.

Um Deus-Filho abaixou-se e se fez tenda
Para cobrir com suas asas olhares e silêncios
Para juntar em campo aberto multidões de fome
E saciar de peixe e pão e também de preces
Esses famintos de ontem e de agora
Quando um discípulo seu levanta um cesto vazio.

Um Deus-Filho abaixou-se e se fez tenda
E deixou atrás de si um pó, por caminhar
De sandálias curtidas e rudes para andar
Mais livre e solto de abraços a oferecer
Livre sem casa e sem onde reclinar
Um corpo cansado de tanto percorrer.


Um Deus-Filho abaixou-se e se fez tenda
E em festa de amigos dançou em companhia
De talhas cheias e vinho abundante
Por desejar oferecer a quem perdeu o tempo
Da festa e da vida em templos vazios,
Um vinho novo que dá respiro leve.

Um Deus-Filho abaixou-se e se fez tenda
Fincada livre em caminhos todos, nossos
Os mesmos que a Jerusalém também levou
Este amado de Deus para ser entregue
Entre hossanas e eucaristias derradeiras
E um lava-pés como braço maior dessa tenda.

Um Deus-Filho abaixou-se e se fez tenda
Despida de tudo e sem o carinho do pó
De todos os caminhos andados e corridos
Sem os abraços e os mimos dos pobres
Apenas os veús das mulheres e um ombro cirineu
Para levar uma cruz até um calvário elevado.

Um Deus-Filho abaixou-se e se fez tenda
Agora erguida em alto e frio madeiro
Sozinho e de lento e frágil respiro
Sem saber porque um Filho tão amado 
Volta ao deserto do abandono por um Pai
Apenas silêncio, na espreita de um forte brado.

Um Deus-Filho abaixou-se e se fez tenda
E desceu à mesma terra de onde fomos tirados
Aconchegado num abraço desse húmus que criou
E deixou como legado para sermos verdadeiros
Gente inteira que no encontro com esse chão
Faz caminho desbravando sem deixar de olhar um céu.
Um Deus-Filho abaixou-se e se fez tenda
Que se alargou por regiões de dentro e fora
Corações e vidas e lugares e infinitos
São agora a promessa de um tempo recriado
Feito de outras tendas em caminhos e margens
As de dentro e as todas as que é preciso alcançar.

Subiu ao Céu este Deus-Filho carregando
O pó dos caminhos e os abraços recebidos
O vinho da festa e o clamor dos pobres
A cor da vida que renovou por inteiro
Sem desarmar a tenda que fincou 
Nos corações agora peregrinos dessa cidade.

Feliz encontro de um Deus-Filho com nosso chão
Como tenda que se abriu e se expande
E se alarga em lugares e pequenas margens
Quando um de nós na esteira desse Filho
Igualmente se abaixa e se faz tenda
De encontros semelhantes mesmo sem perfumes caros.

Feliz encontro de um Deus-Filho com nosso chão
Pródigo de sentido como marca dessa vinda
Esse abaixamento-oferta de imensa luz
Para nosso andar ainda trémulo prosseguir
E desfazer o desencanto de não saber chegar
A esse lugar que já se desenha no caminhar.

Feliz encontro de um Deus-Filho com nosso chão
Convite sempre maior para ninguém se iludir
Que chegar ao céu é somente desejar e subir
A todo o custo, e querendo alcançar
Esquecendo que um Filho ensina a caminhar
Com os olhos postos aqui e nesse lugar.

Pe. Afonso, CSh

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