Espiritualidade de Serviço ao Outro
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Espiritualidade de Serviço ao Outro
Conta Leonardo Boff, que num encontro com Dalai Lama, lhe perguntou qual era, segundo ele, a melhor religião. Esperava talvez escutar um elogio do Budismo Tibetano... Mas não foi essa a resposta do líder oriental. A melhor religião é aquela que ajuda você a ser uma pessoa melhor – respondeu o Lama. E, para não perder a viagem, Boff teria perguntado: e o que significa ser uma pessoa melhor? E a resposta continuou simples e essencial: ser uma pessoa melhor significa ser bom para você mesmo e para todas as pessoas e todas as criaturas. Ser bom para si mesmo, para com os outros, para com todas as criaturas. É esse o selo que chancela a verdade da espiritualidade. Quando ela gera serviço, doação, amorosidade, entrega. Pelos frutos conhecereis a árvore – diz o Evangelho. A Espiritualidade que não se torna serviço tem algo viciado no caminho. Há uma espiritualidade adolescente, baseada nas ideias de conquistar "o meu ser", “a minha iluminação”, "a minha liberdade", "o meu êxtase". Mas a espiritualidade que chegou à maturidade, torna-se doação. Geralmente não fala em iluminação e nem em estados especiais, transpessoais, transcendentais. A vida se abre aos outros (e não se fecha no eu) e o horizonte passa a ser colaborar para que os outros encontrem a felicidade, o caminho. Como alguém que descobriu que a liberdade se torna amor quando aprende a servir, a pessoa espiritualmente madura deseja cuidar e diminuir o sofrimento mediante seu serviço e sua intenção solidária. Deseja apenas ser humano e não exatamente uma pessoa iluminada. Sua virtude é amorosa, materna, cuidadora, compassiva, ao contrário de servil e egoísta. A transformação espiritual é autêntica e significativa, quando nos permite mais serviço e doação aos outros. Como diz um ditado budista, o que não é feito para o bem dos outros, não merece ser feito em primeiro lugar. E este olhar se torna compaixão por si mesmo, pelo outro e por todas as criaturas. O Espírito de Deus dorme na pedra, acorda nas flores, movimenta-se nos animais e torna-se consciente no ser humano – dizia um monge dos primeiros séculos. Essa presença amorosa do Espírito de Deus, em tudo e em todos, acorda e atrai o olhar de compaixão. A Espiritualidade Cristã é concreta, porque Deus é concreto – diz o papa Francisco. Perguntaram a José Saramago: Como pode uma pessoa ser boa sem Deus? E ele terá respondido com outra pergunta: E como pode uma pessoa com Deus ser má? Este questionamento de um ateu confesso, certamente nos inquieta. Talvez questione a Espiritualidade. Talvez nos pergunte qual o tipo de espiritualidade que as pessoas que se dizem ‘com Deus’, na realidade vivem. Talvez esse ‘ter Deus’ não tenha se tornado experiência, não tenha transformado a pessoa... e por isso não se traduza num estilo de vida que espalha bondade. Uma espiritualidade que não se traduz em amor-doação... se autoquestiona pela sua autenticidade. Lembro de uma conversa de D. Aloísio Lorscheider, partilhando uma viagem em que ele, com um grupo de outros Bispos brasileiros, andou pelo Japão e fez várias palestras sobre Cristianismo em algumas Universidades. No final de uma palestra, uma pessoa terá dito: gostamos muito da vossa religião, gostamos do que vocês disseram sobre o Cristianismo... mas não queremos essa religião para nós, porque o Brasil, que é um país tão cristão, é dos países onde há mais desigualdade social. A Espiritualidade leva naturalmente a um compromisso social, na criação de estruturas mais justas e fraternas, que expressem e sustentem uma vida digna e abundante para todos. Não poderia esquecer o relato sacramental de D. Hélder Câmara: conta-se que um dia, o bom velhinho, já idoso e cansado, quando se preparava para ir dormir, tarde da noite, escutou alguém batendo na sua porta. Ele foi atender, como sempre fazia com toda a sorte de gente que o procurava em sua casa. E, pela porta semiaberta, ele viu o rosto de um homem e pelo hálito, percebeu que ele estava alcoolizado. Sentiu o incômodo. A uma hora destas, quando já se preparava para dormir, cansado... vem esse homem bêbado importunar – sentiu dentro dele o bom profeta. Mas, logo de imediato, ele se refez e, caindo em si, abriu aquele sorriso lindo e disse para o homem: Ah, Cristo... você não me engana mais!
Pe. Domingos Cunha, CSh
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