Cheirar Deus para Cheirar à Deus

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10 - Cheirar Deus para Cheirar à Deus

Voltemos na quarta pessoa da parábola, aquela que recebeu de Deus o Pote com seu Amor... e derramou seu conteúdo pelo corpo, respirou fundo saboreando o perfume e saiu andando por aí e espalhando por entre o povo o Cheiro de Deus. A Espiritualidade começa aqui. Cheirar Deus. Deus não se explica; Deus se cheira, se respira. Santo Agostinho declamava: espargiste tua fragrância e, respirando-a, suspirei por Ti. Eu Te  saboreei e agora tenho fome e sede de ti.  No princípio, Deus criou o Ser Humano do pó da terra e soprou nas suas narinas e ele se tornou um ser vivo. Sopro, Ruah, Espírito, Espírito de Deus, Espírito Santo... Sopro, respiração. Respirar Deus. Respirar conscientemente é deixar-se recriar e deixar-se perpassar pelo Espírito que nos sustenta e nos faz ser, em comunhão com o Ser-Fonte. Respirar... até que nossa respiração se torne a nossa oração. A Oração do Ser, que perpassa todo o nosso ser. Cheirar Deus... sentir o cheiro de Deus, deixar-se tomar por Ele... Para depois cheirar à Deus, espalhando o Amor por onde se passa na vida das pessoas e no mundo, por entre as criaturas que povoam o Universo.  A Espiritualidade começa quando se torna experiência, vivida, sentida, saboreada, quando provoca em nós transformações profundas, a partir de dentro, a partir das entranhas, através das sensações físicas, passando pela tomada do coração, na construção de uma relação afetiva e depois, só depois, iluminada e discernida pela razão, para que a fé se torne inteligível e possamos dela dar razões. Quando cheguei ao Nordeste do Brasil, em 1985, eu não sabia o que era uma manga. Manga, para mim, era apenas a manga da camisa. Não conhecia a fruta desse nome. Fico pensando que se alguém chegasse falando de uma fruta chamada manga e sobre ela fizesse um discurso lindo e me desse livros para eu estudar os benefícios da manga e sua composição química e seus nutrientes e a família a que pertence na botânica... eu poderia ter até me tornado um especialista em manga; quem sabe até dar aulas e escrever livros exaltando a manga... mesmo sem jamais ter chupado uma manga. Mas não foi assim. Alguém um dia me deu uma fruta estranha e disse: experimenta. E eu dei a primeira mordida e senti o sabor, depois outra e outra. E me senti envolvido e tocado pelo sabor daquela fruta e depois, apaixonado por ela. Queria mais. E depois, só depois, eu quis saber o nome desse fruta... e fui atrás de ter sobre ela mais informações. Lembro até de ter plantado vários pés de mangueira, de manga rosa, cujo sabor me fascinou. Aqui está o caminho da Espiritualidade. A tentação das tradições religiosas sempre foi acreditar que começando pelo racional, a pessoa toda será convertida. Mas o que começa no racional, não vai além dele. Tomás de Aquino dizia que nada chega ao intelecto sem ter entrado pelos sentidos. Ele já havia entendido, como bem testemunha a origem vivencial do cristianismo e a arte de saborear que Jesus incorporou das tradições semitas, que tudo começa pelos sentidos, pelas sensações físicas, pelo que desperta e mexe com nossas entranhas. É visceral, em primeiro lugar, a nossa experiência de Deus. Vêm depois os sentimentos e emoções, o bem querer, o amar e ser amado, a relação afetiva, tanto e tão bem testemunhada na vida dos grandes místicos, em todas as grandes tradições. Uma relação a partir do coração. E depois... isso sim, só depois, vem a intepretação do vivido, daquilo que foi sentido, entrando em cena a razão, para explicar e iluminar, entender,  sistematizar e dar razões, capazes de gerar e sustentar o sentido.

Pe. Domingos Cunha, CSh

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